terça-feira, 9 de novembro de 2010

Milagrário Pessoal

Fui ver a apresentação do último livro de José Eduardo Agualusa na Fnac - Milagrário Pessoal - eis-me na segunda fila, com poucos oponentes na primeira, a não ser a sua, presumo, namorada - alta, esguia, branca, olhos e lábios muito expressivos, brasileira pelo sotaque, bonita à sua maneira, orgulhosa de estar ali ao lado dele, ele a precisar dela para pegar no casaco, ou para lhe dar uma caneta para assinar livros, ou para lhe confirmar datas ou nomes que não ocorriam no momento discursivo. mas deixemos em paz a namorada do Agualusa, não é por isso que estou aqui. Queria sentir a magia que sonho que todos os escritores devem ter a transpirar por todos os poros; dizer que olhei bastante o agualusa para ver essa magia; houve a certa altura um mau sinal da minha parte por ter querido olhar tanto, sem olhar, que ele se dirige a mim e afirma que eu devo ter muitas perguntas para fazer. e tive, mas sairam tão desconcertadas e previsiveis que deve ter ficado a achar que eu parecia mais interessante por fora do que o resultado da minha actividade cerebral. são assim algumas situações. o que circula nas fileiras internas não corresponde depois ao resultado exterior, fica-se bacoco. em contrapartida, o Agualusa falou da língua portuguesa, de Angola, da ressaca do escritor depois de escrever, do sonho que todos os escritores têm de criar novas palavras; fez ainda uma leitura de uma passagem do seu livro; disse que tinha vindo da Alemanha, os seus livros estão traduzidos em mais de vinte paises, e agora ali, naquele espaço, a meia luz, com tão poucas e mais ou menos silenciosas pessoas, e ele, tranquilamente a fazer o seu milagrário pessoal.







(...)"O nosso destino é o de nos engolirmos uns aos outros, disse-me Moisés da Conceição quando há alguns anos o encontrei, nesta nossa cidade de Luanda, onde o trouxera o negócio da cera. Se os portugueses comeram dos angolenses, e estão comendo, hão-de os angolenses comer também seu pedaço dos portugueses, e desta forma, todos bem nutridos,


melhor enfrentaremos o porvir e a cobiça dos povos alheios.

Os descendentes dos angolenses, hão-de um dia falar um português próspero, redondo e musical, e quem os ouvir talvez consiga escutar no eco de certas palavras o largo rumor do Quanza passeando-se em direcção ao mar, o colorido piar de suas muitas aves, o zunirdos insectos, o cair das chuvas, o ribombar dos trovões, o silvo do vento soprando húmido por entre o capinzal(...)

Excerto do cap.II.

1 comentário:

  1. A moça não é a namorada do Agualusa, estava ali para ajuda-lo, em todos os sentidos presumo, mas não é sua namorada. Ele conheceu a moça na apresentação do livro em Lisboa e esperto como é já aproveitou para usa-la como secretária, sem gastar um cobre..Ah ah ah

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