segunda-feira, 7 de setembro de 2009

As caminhadas nocturnas

23:00, em casa, e já mais descansada, faço a trajectória mental da minha última caminhada nocturna. Quando tudo à nossa volta está incrivelmente parado, afásico, chato, há que mexer o corpo para a mente não entrar em parafuso, ou desparafusar por completo. Viver no bucolismo pode cansar um espírito hedonista. Ainda que não há mal que dure para sempre também não há bem que faça bem para sempre. Anyway, o segredo está em contrariar tudo, para termos o retorno em felicidade. Esse é um dos pensamentos que tem vindo a povoar a minha cabeça: senão vejamos, quando estou um sábado e domingo prostrada, sem apetite de fazer rigorosamente nada a não ser preguiçar no sofá, sem mexer um musculo, só mesmo o polegar e o indicador dos dedos para virar a página do livro, enviar mais um sms, ou teclar no computador para mudar para a próxima faixa de música de outro cd; quando o tédio é maior que a vontade, há necessariamente de não ouvir os desejos do corpo e da carne deleitosamente refastelada no prazer de dolce fare niente, e procurar o movimento. Andar, mexer os braços, as pernas, ou seja, libertar endorfinas. Daí, advém a maior das alegrias, garanto-vos. Pelo que, oxigenar o corpo pode ser incrivelmente uma sensação de felicidade extrema. Posto isto, e nos últimos dias, decidi encetar as minhas caminhadas nocturnas, umas vezes acompanhada, outras sozinha com a exaltação dos meus pensamentos. Hoje, no entanto, a coisa foi diferente, saí, bati o portão, olhei a lua que parecia abraçar o planeta de tão majestosa e grandiosa, o calor de Setembro a afagar a pele, umas calças de fato de treino, a t-shirt e o telemóvel para povoar as minhas mãos que não sabem não estar ocupadas, andantes dengosas na rua, e aí vou estrada fora. O ritmo que tentava manter acelerado foi logo abortado; primeira paragem: full stop for compliments. Duas senhoras velhotas, sentadas num banquinho em pedra, junto a umas bombas de gasolina, e detrás de uma lavagem automática de carros (imaginem o cenário), estas duas senhoras que assistiram aos meus primeiros passos, todos, digo-vos eu, até os grandes trambolhões da minha bicicleta lilás que tive quando era garota, ou os passos, em versão corrida atabalhoada pelo canelho que dava para a casa do meu avô, diziam-me: - então já vai dar a sua voltinha? - Tem que ser, respondo eu. E vocês não vão dar uma voltinha? - Oh menina, nós já não podemos, as pernas não deixam, mas vemos os outros caminhar; (individual thought: quando não se caminha com as pernas, caminha-se com a mente. Será que é isso a velhice? Será que é essa a alegria que se tem quando as pernas não cumprirem a sua função? Vendo assim as coisas, parece-me compensador, chegar à velhice e não podendo exercitar as jambes, ao menos ser feliz ao recordar as caminhadas passadas. Por enquanto, eu ainda tenho muito caminho e as pernas ainda muito para palmilhar e volto assim à estrada, deixando-lhes o meu melhor sorriso semelhante a uma gioconda ensimesmada. Mais à frente, desta feita um grupo de senhores e senhoras de meia idade, uma delas com a bengala a firmar terreno, olham para mim para receberem um cumprimento; assim o faço, uma boa noite o mais inaudível possível para não perturbar a hegemonia do grupo que às tantas dizia: o Amor e a compreensão, tudo vencem! Com esta me arrombaram, chek-mate. Parti, sem mais delongas, que o percurso me espera para ao menos pensar que corro na corrida de combater a celulite que se instala dia a dia, pois com amor e muita compreensão, à mistura, talvez seja a próxima Catarina Furtado cá do sitio….

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